sábado, outubro 29, 2005
domingo, outubro 23, 2005
QUANDO AS APARÊNCIAS ILUDEM AS SUBSTÂNCIAS DESILUDEM
Quando as aparências iludem as substâncias desiludem, mas isso não significa necessariamente que se fique desiludido no mau sentido, o que acontece é que desaparece a ilusão. Quando se aprende o truque a magia deixa de espantar, mas quem sabe truques é o mágico que fascina através das aparências e da sua ilusão. O fascínio que o mágico desperta nos iludidos que o observam é o que os faz despertar para as substâncias previamente ocultas. Todas as substâncias, agora reveladas, dizem a mesma coisa: “só há uma única substância”. Somos todos o mesmo em manifestações diversas.
SONHO ANTES E DEPOIS
Estou a pensar em ti. Gosto de pensar que tu estás a pensar em mim enquanto eu penso em ti. Gosto de pensar que tu gostas disso como eu gosto. Penso nisso. Acendo mais um cigarro. Penso no vazio da distância. Olho para os desenhos que o fumo faz no ar. Está frio lá fora mas já não chove. Penso nas escolhas que fiz e nas que gostava de fazer. Agarro a chávena quente com as duas mãos. Penso em te dizer que penso em ti. Encosto a cabeça a uma almofada vermelha e fecho os olhos. Penso que sonho contigo. Quase consigo sentir a proximidade imaginada. Espreguiço-me com melancolia. Penso na espera pela concretização real do sonho. Subitamente sinto-me lamechas e tento por um ar sério. Gozo com isso. Fumo mais um pouco. Penso nos limites que o medo impõe à expressão. Penso que devia escrever algo sobre isso. Penso nos limites que a expressão impõe ao medo. Bocejo. Olho para a parede vazia. Volto a pensar em ti. Gostava de te ter à distância de um abraço. Penso em nós. Sinto um aperto nas entranhas. Estranho o silêncio que se abateu sobre a noite. Enrolo os cabelos nos dedos enquanto penso. Lembro-me que tu também gostas de fazer isso. Penso que me estou a iludir. Penso-me. Ouço o vento a bater à janela. O relógio continua a girar. As pontas de cigarros contam os minutos solitários. Tento escrever alguma coisa mais mas não me lembro de nada que valha a pena ser dito. Penso em dizer o que penso. Sinto o que penso. Corro os cortinados e cubro-me com uma manta. Penso no teu perfume. Lembro-me daquele olhar. O cansaço transforma-se em calma. Penso em ti até adormecer, depois sonho e antes também.